sexta-feira, maio 28, 2010

Recreio com legendas

Desde que viemos para o Recreio em 2001, começamos a circular a pé (FOTO 23) pelo bairro para conhecer tudo que havia por perto que pudesse nos ajudar, tanto na montagem do apartamento como oque fazer para lazer, diversão, e das necessidades do dia a dia. Precisávamos encontrar por perto desde uma simples loja de material de construção a um restaurante para as refeições por que nesse primeiro ano não havia gás no nosso apartamento. Até hoje o bairro carece de uma infraestrutura para essas necessidades diárias, mas há nove anos era pior. Pra começar, a própria rua ainda era de terra batida (FOTO 17). E por isso era mais desabitado ainda. Considerávamos isso um ponto positivo porque assim fazia com que a rua tivesse um clima de cidade do interior, tranquila e silenciosa.

Aos poucos fomos descobrindo o centro comercial do Recreio (FOTO 1), que fica no caminho para a praia e que atendia essas necessidades. E na verdade continua atendendo. Lá tem uma padaria (FOTO 2), uma drogaria, uma locadora de filmes, uma casa de sucos, uma casa de material de construção, uma loteria esportiva, uma papelaria e uma vidraçaria. Mesmo com a abertura de vários supermercados (FOTO 12), foi nessa padaria que passamos além de fazer compras, a fazer as refeições ou então comprar seu famoso frango assado para o almoço. Edu adorava comprar esse frango para incrementar com suas receitas nosso almoço. Nada era tão trivial como parecia (FOTO 24). Esse frango se transformava num prato requintado e muito saboroso com suas idéias adicionais. Edu tinha um prazer enorme de cozinhar e foi se aprimorando com o tempo.

Nesse centro comercial ele fazia seus jogos da mega sena todo o sábado. Acho que além do trabalho esse foi seu único vício. Saia da loteria (FOTO 1) dizendo sorrindo que no domingo seríamos os novos milionários do bairro. Mas enquanto esse dia não chegava, aproveitávamos o sacolão (FOTO 14) que funciona no estacionamento desse centro comercial para comprar legumes, verduras e frutas. Eduardo tem uma relação com feiras muito forte. Deve ter sido feirante numa vida passada. Para ele era uma diversão e um prazer enorme ficar escolhendo esses produtos. E assim fomos descobrindo no bairro onde alimentar o corpo.

Com o tempo adquirimos duas bicicletas (FOTO 6) para os passeios mais longos. Chegamos ir até a praia da Reserva (FOTO 25) e a prainha (FOTO 28) pedalando. Virou um hábito muito prazeroso, pedalar lado a lado, conversando, sentindo a maresia e o vento no rosto. Desbravando o bairro (FOTO 33), nos divertíamos aprendendo os nomes das ruas mais próximas e as mais importantes (FOTOS 34).

De inicio íamos muito ao Shopping Via Parque (FOTO 13), especificamente para ir ao cinema, mas quando surgiu o Shopping Recreio (FOTO 15), acabou virando nosso point para assistir filmes. Não é um shopping muito frequentado por que não tem muitas variedades de lojas, mas é tranquilo e além dos cinemas tem uma boa praça de alimentação. Edu era muito calorento e passeios em Shopping para ele era um alivio em dias muito quentes. Pronto já tínhamos descoberto nosso espaço para lazer.

Aos poucos o bairro foi crescendo e vários restaurantes foram surgindo ao longo dos anos e alguns bem pertos que podíamos ir a pé. A Adega do recreio foi o primeiro e durante anos ria cada vez que íamos lá porque como eu não gostava do atendimento reclamava que não voltaria. Na pizzaria Domino´s íamos poucas vezes, na maioria pedíamos para entregar em casa, a oficina do Chopp era ideal para sábado a noite beber um chope e conversar, o Barraco era para um encontro especial com os amigos, no restaurante Romanella (FOTO 22) foi nosso point nos almoços de domingo e algumas vezes no rodízio de massas à noite, o comida mineira era para quando estávamos realmente dispostos a comer muito, quando não íamos jantar na Parmê pedíamos em casa, no Manuel e Juaquim Edu gostava dos pratos diferentes e por fim a Churrascaria Estrela do Sul foi o local que brindávamos algumas datas especiais.

Aos poucos fomos definindo nossos cantos preferidos pelo Recreio. Se fossemos caminhar, o sentido sempre era no da Barra porque era menos movimentado. Íamos até o último quiosque (FOTO 11), parávamos ali para beber uma água de coco e ele fazer seus abdominais (FOTO 31). Claro, nunca era somente uma simples caminhada, tinha sempre que se exercitar (FOTO 3). Nesses últimos meses, nossas caminhadas não iam mais até o último quiosque, chegávamos até uma árvore (FOTO 3) no final da ciclovia. Sentávamos ali para usufruir da sombra, descansar e conversar. Essa árvore foi testemunha de muitas conversas sérias que tivemos. Não gostava de vê-lo calado e insistia em saber o que estava pensando e sentindo. E como sempre, me poupava com suas respostas cautelosas. E assim fomos levando, acreditando que tudo iria passar. Talvez entre tantos lugares que escolhemos para ser nosso cantinho, essa árvore é a que mais revela momentos tristes.

Mas o Recreio sempre foi para nós, um bairro que nos trouxe muitas alegrias. É um bairro de praia (FOTO 7), de sol, de vida. E foi por isso que viemos para cá. Em busca de felicidade, de tranquilidade e de ter a sensação de estar num bairro que não parecesse ficar dentro da cidade. E o Recreio sempre nos pareceu ser assim.

Foi pensando nessa tranquilidade que escolhemos nosso lugar na areia da praia. A informação para os amigos era logo depois do segundo quiosque após o posto nove (FOTO 18). Ficávamos bem ao lado da barraca do Paulo. Ali era nosso point (FOTO 4). Não ficava cheio e passávamos nosso tempo ali, ouvindo o barulho das ondas, vendo o azul do céu, os ambulantes gritando para vender suas mercadorias, os surfistas, os pássaros e algumas vezes os artistas de TV. Levávamos a cadeira, toalha e o guarda sol. Mesmo se enchendo de Sundown para não ficar “manchetado”, como ele dizia, Edu ficava embaixo, lendo seus livros ou revistas de veterinária. Eu ficava na cadeira lendo meu jornal. O mundo poderia ter parado nesse momento porque eram momentos que não fazíamos nada, mas nem por isso deixava de ser especiais. Vez por outra um comentário do livro ou do jornal transformava-se num debate sem fim. Gostávamos de compartilhar assuntos intrigantes ou apenas comentar uma novidade. Um completava o outro nas informações que lia (FOTO 8). Consigo fechar os olhos e lembrar essa cena se repetindo por vários finais de semana. Como eu aprendi conversando com ele, como admirava sua inteligência, seu raciocínio rápido, sua capacidade de explicar as coisas. E tive a oportunidade de dizer isso mil vezes olhando nos seus olhos. Que bom que sempre fui assim, falador. Digo e repito mil vezes quando amo, quando estou feliz, quando admiro, quando me emociono. E ele me fez sentir tudo isso e graças a Deus não levo remorso por ter deixado de falar essas coisas (FOTO 32).

Nesse canto da praia ficávamos sozinhos ou vez por outra na companhia da Sheila ou de tantos outros amigos que puderam conviver com essa nossa rotina simples de vida (FOTO 19). Quando terminava sua leitura, se levantava e eu já sabia o que ia fazer. Correr e fazer sua musculação nos aparelhos da praia (FOTO 10). Ficava admirado com a sua disposição. Tinha orgulho de como se cuidava. De como tinha prazer de se exercitar. Era nesse pequeno território na areia que no réveillon (FOTO 9) ficávamos para ver a queima de fogos e brindar a chegada de um ano novo.

Hoje passo por ali e fico olhando o vazio, tentando lembrar quantos finais de semana estivemos ali, rindo ou conversando. A praia hoje está vazia, assim como eu (FOTO 16). Dói-me ficar olhando as ondas e aquele nosso espaço na areia e saber que não vão se repetir mais. Como pode? Não entendo. Até ontem ele estava aqui (FOTO 5), podia sentir seus braços, podia vê-lo correr na areia, olhar para o seu rosto, rir com ele (FOTO 20). Isso tudo acabou. Tenho que aceitar. Tenho que seguir em frente. Tenho passado os dias brigando com a saudade. Refaço esses cantos que escolhemos todos os dias para tentar amenizar esse vazio. Quando me deparo com esses cantos, revejo nossa vida. Percebo que o Recreio não é mais a mesma coisa para mim. Perdeu o encanto, o charme (FOTO 21). Não é mais aquele bairro que conheci pelos comentários do Eduardo. Sim porque era ele quem me chamava à atenção para uma construção nova, um prédio com uma arquitetura diferente (FOTO 29), uma árvore que foi plantada na praça (FOTO 26), o lixo jogado na lagoa, os micos passeando nas árvores, a má conservação dos aparelhos de musculação, a revoada dos pássaros no final de tarde, os jacarés de papo amarelo (FOTO 30), as várias raças de cachorros que encontrávamos pelo caminho (FOTO 27), e tantas outras coisas que foram fazendo com que o Recreio crescesse. Hoje para mim, o Recreio está sem legendas. As imagens que vejo continuam com as mesmas legendas que ele me disse um dia (FOTO 29) e para mim são definitivas.



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