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Quando se tem um relacionamento de companheirismo e de parceria, é certo que vamos aprender um com o outro, vamos absorvendo o que o outro tem de melhor e fazer uso durante a vida toda. Eu espero que continue a fazer uso das coisas que aprendi com o Eduardo porque em vida eu vi o quanto ele pos em prática as coisas que aprendeu comigo.
Sempre tivemos bichos em casa mas sem a mínima noção de qual ração dar (nem sei se tinha ração nesse tempo), dávamos comida de panela, e as vacinas eram somente aquelas de campanhas. Enfim, não cuidávamos dos animais como realmente eles deveriam ser cuidados. Tanto que quando morerram desistimos porque foi um sofrimento bem grande. Já que Edu é Médico Veterinário vou começar por fatos ligado aos animais.
Quando entrou na minha vida começou a contar sobre sua paixão pelos animais. Com o tempo fui virando assistente do veterinário, me ensinou muitas coisas sobre medicamentos, a aplicar injeções, tipos de ração, ler sobre determinadas doenças, enfim, virei enfermeiro nas horas que precisava. Vi ele fazer vários partos dificéis, vi sua luta para dar remédio em certos gatos, vi sua disponibilidade para os horários e lugares mais dificéis para poder fazer um atendimento, presenciei várias vezes interromper um almoço, jantar ou mesmo uma festa para sair as pressas para atender, vi sua emoção em ter que fazer uma eutanásia assim como vi os afagos que fazia em todo animal que passase pela sua frente. Eu tinha um orgulho tremendo dessa sua disposição, muitas vezes cansado é claro, mas sempre honrando sua profissão.
Esse amor e conhecimento que adquiri com ele me fez ficar mais sensível a animais por exemplo. Não andava mais impune quando via um cão solitário, um bicho doente, atropelado, que já tentava fazer algo, ou quando não podia, fica sensibilizado com a cena. O que antes me passava desapercebido, com a sua chegada passei a ter outros olhos para essas cenas.
Tanto mudei que aceitei ganhar dele um boxer abandonado na clínica. Depois de 16 anos voltamos a ter um cachorro em casa. Tudo foi mais fácil tendo a ajuda de um veterinário por perto. Agora sim podia dizer que tinha cachorro e sabia cuidar de verdade daquele animal indefeso e tão dependente da gente. Nino (o boxer) foi a alegria da nossa casa por 12 anos, mesmo sendo um cão epilético. E com a chegada do Eduardo em minha vida, do seu olhar sensível para as coisas belas da vida, foram surgindo também os gatos, apareceu um, depois outro, mais outro e mais outro, até formarmos uma familia de 7 gatos de rua, todos devidamente vermifugados, vacinados e castrados. Em outros tempos teríamos expulsados esses gatos todos, colocados num terreno qualquer e deixados para que a vida desse um jeito neles. Mas agora não, meus olhos via com os olhos dele. Não podia deixar isso acontecer, então ficamos com todos e cuidamos deles. E se não tinhamos condições de ficar com mais, procuravamos quem tinha e podia ficar com esse pequeno indefeso. Em todas as viagens que fizemos não tem uma que não tenha uma história de um animal que se aproximou dele e que não tenha tido sua atenção por um bom tempo.
E foi assim também para todas as outras coisas. Dava atenção a tudo. Perdia um tempo enorme, eu diria. E eu já não conseguia mais olhar para plantas e árvores como antes. Seu cuidado com a natureza era enorme, era um olhar para detalhes que eu nem percebia, quer seja uma planta esquisita ou um galho seco no meio de uma vegetação verdinha. Eu nunca soube a diferença entre um ibisco e uma papoula. Nem sei se há diferença. Nem tinha muita paciência para plantas. Tanto que brincava com ele que por mim colocava cimento em todo o jardim do apartamento. Ríamos com isso, porque sempre que me pedia para molhar as plantas eu dizia que era parte dele. Mas não dava mais para ser como antes, meus olhos agora viam aquelas plantas como minhas também, não gostava de vê-las secas. Achava bonito ver as flores nascendo, o verde vivo quando terminava de molhar ou quando a chuva caia levantando o cheiro de terra. Quando fomos conhecer a Floresta Amazônica pelo lado do Pará ou mesmo em Rondônia, se encantou com o tamanho das árvores e ouvia atentamente o guia falar das propriedades que cada uma tinha. Se eu não anotasse esquecia tudo mas ele não, podia passar anos que mesmo em outro lugar, quando via uma árvore, me lembrava que já tinhamos visto em tal lugar. Vi sua tristeza e revolta quando cortaram a árvore que havia em frente ao nosso prédio. Não se conformou já que a árvore não estava doente nem apresentava problemas que precisasse ser retirada.
Meu paladar também mudou por sua causa, melhorou, e muito. Não aprendi a cozinhar como ele embora até isso tenha me ensinado, mas aprendi a valorizar os temperos, a prestar atenção no preparo dos alimentos e até mesmo a ter prazer em estar na cozinha e preparar desde um simples lanche a um almoço caprichado. Não havia diferença. E nada podia sair errado, ele valorizava esse momento como se fosse uma cirurgia importantíssima, um caso de vida ou morte. E ficava feliz quando tudo saia certo e era elogiado por isso. Tanto gostava de preparar a comida como gostava de comer. E comia bem e muito. Íamos aos melhores restaurantes e mesmo durante as viagens procurava sempre comer o prato típico da região, mesmo que fosse uma "buchada de bode". Tinha que experimentar para saber se era bom ou não. Eu admirava esse seu jeito.
Tudo na minha vida passou a ter um outro olhar depois que o conheci. Observar a beleza de um prédio, de um objeto, de uma flor, de uma planta, de gatos brincando pelas ruas ou mesmo numa revoada de pombos. Não tem como eu passar pelo centro da cidade e não me emocionar com o Teatro Municipal, com a Biblioteca Nacional ou qualquer outro monumento. Ele me chamava a atenção para detalhes na arquitetura que eu só via com os olhos dele, para mim o conjunto já era bonito. Passear pelo centro ficou complicado por que me trás lembranças desses passeios, desse seu olhar, da minha preocupação para que ele não caisse ou tropeçasse já que andava olhando para o alto, feliz com a recuperação dos casários antigos. Essas coisas simples era motivo de felicidade para ele. Eu agora busco esse olhar. Assim como se admirar com uma mesa ou uma moldura, ter certeza que tal objeto ia ficar bom em tal lugar comprar e sair com aquele peso para levar para casa. Quantos objetos foram comprados assim, com esse olhar precioso de um garimpeiro quando vê algo valioso.
Esse olhar que me fez ver que podemos sorrir com pequenos prazeres, que podemos ver beleza e fazer com que isso nos faça bem, um olhar que valoriza tudo, desde pequenas e simples coisas a coisas grandes e valiosas. Me lembro dessas coisas e vou continuar buscando esse olhar para que isso não morra também. Que tudo isso que me ensinou faça com que eu continue melhorando para que eu consiga ver pelos seus olhos o que gostaria que eu fizesse, que caminho seguir. Se aprendemos com a morte como falam, espero eu poder aprender com a dele, mas o mais importante pra mim foi o que aprendi com a vida e é com esse aprendizado que vou tentar seguir adiante, tentando continuar a ver a vida pelos seus olhos.
Um comentário:
Saudades enormes!!!!
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