terça-feira, março 02, 2010

14 de setembro


O Ano de 1992 não foi muito feliz na minha casa, descobrimos que meu irmão estava doente e foi um sofrimento para todos. Tentávamos levar uma vida normal mas cada dia ficava mais difícil, pois não é que no dia 14 de setembro fui a uma boate com um amigo e lá estava o Eduardo, dançando sozinho. Gostei de cara e me aproximei. Conversamos mais e mais e mais e quanto mais falava mais gostava dele. Terminamos nosso papo no via onze, comendo cachorro quente no carro, um fiat que ele tinha. Engraçado lembrar isso porque ele quis me levar em casa, já era madrugada e eu orgulhoso como sempre recusei. Ele insistiu e eu menti dizendo que morava em Madureira porque dali seria mais fácil ele ir embora para Nova Iguaçu, tive medo que ele se perdesse indo por Vaz Lobo. Como é estranho lembrar dessas preocupações com uma pessoa que vc tinha acabado de conhecer. Fizemos isso a vida toda, mas éramos estranhos ainda. Menti por várias vezes que morava em Madureira, tanto que pouca gente sabe que meu apelido para algumas pessoas da família dele, é MADUREIRA. Quem me batizou assim vou o primo mais querido dele, o RONALD. Passei a ser o Madureira para Tia Tomázia, Tio Antonio, Robinho, Rogério, Silvana e Sueli. Claro que com o tempo contei que morava perto de Madureira mas o apelido não foi embora. Tenho certeza que Deus me enviou esse anjo para que eu pudesse suportar a perda que estaria por vir. Sempre disse isso a ele, e agradeci várias vezes a força que ele me deu. Teve a oportunidade de conhecer outro anjo que foi meu irmão e esteve comigo e meus pais no dia da morte dele. Lembro que sai o dia todo com Janaina para comprar pratos para levar para o apto de jacarépagua. Meu irmão foi internado naquela tarde com problemas respiratórios. Me encontrei com Eduardo e ele disse que todos estavam a minha procura e me levou a Clínica onde ele estava. Nesse momento estavam minha mãe, alguns parentes e o amigo Getúlio Barbosa, do atelier que meu irmão trabalhava. Não sei como tive forças para ver meu irmão entubado, sem poder falar, somente seus olhos seguiam a gente pelo quarto. Aquilo me deu uma aflição tão grande. Eduardo tinha que trabalhar no dia seguinte e me perguntou se queria que ficasse. Eu preocupado como sempre, porque sabia que ele levantava cedo, disse que não precisava, mas meio a contra gosto, queria muito que ele continuasse ali comigo, era meu anjo, e meu anjo era médico, veterinário, mas médico. Ele se foi e no fundo eu queria que ele dizesse que ia ficar porque eu não tinha coragem de pedir. Nos conhecíamos de pouco tempo, como pedir para alguém que conhecemos pouco para passar por aquela situação tendo que trabalhar no dia seguinte? Ele se foi e eu ainda gritei para que voltasse, mas não tenho certeza se gritei realmente ou foi somente no pensamento. Ele foi e eu tive que enfrentar o quarto onde estava minha mãe e meu irmão. Meu irmão gostava mais de samba que eu, se eu já gosto vcs imaginem alguém gostar mais. Ao longe eu ouvi um batuque, meu irmão transpirava muito, abri a janela e o som do samba entrou pelo quarto. Cheguei a falar, "ouve só, tem um samba rolando aqui perto". Ele me olhava o tempo todo. Perguntei se estava com sono e com firmeza disse que era para ele dormir porque estavámos ali olhando por ele, eu e a mãe. Abri seu pijama e comecei a alisar o peito dele. Ainda sinto em minhas mãos seus ossos do peito. Comecei a fazer carinho e pedi para que ele dormisse, ele foi fechando os olhos, fechando, olhei para a mãe, ela ia se desesperar e eu entre os dentes pedi calma. E Ele dormiu. Choramos e dali mesmo parti correndo para casa porque a Clínica era perto, para dar a noticia a meu pai que sem forças estava com minha prima Gilda. Peguei a roupa mais bonita a que ele mais gostava e voltei para a clínica correndo, queria terminar aquilo o mais rápido possível. Nunca pensei em vestir um irmão depois de morto mas eu precisava fazer aquilo, eu o amava, dormíamos no mesmo quarto, tinha um gênio do cão, mas era uma pessoa muito bondosa, tirava a cueca se preciso for para dar para o outro. Morreu aos 28 anos e meu porto seguro foi esse outro anjo, Eduardo Simonato.

3 comentários:

festa animada disse...

Zé, sempre ouvi vc contar esta história do seu irmão, mas não sei o por quê lendo agora me emocionou ainda mais. Vc sempre teve um anjo ao seu lado, anjo guerreiro e fiel. Sempre. Espere, lute, pois o tempo agora é o seu aliado. Te adoro! E sempre achei que o Edu era a sua outra metade. E sempre vai fazer parte de vc. SEMPRE. Bjs

José Carlos Albernaz disse...

Eve, gosto tanto de falar com vc. Sua voz me dá força, me traz de volta a alegria das nossos dias, das bobagens que trocamos, das brincadeiras sadias que faziamos, de ser criança sempre. Obrigado pela sua amizade, pelo seu amor.

Unknown disse...

Zeca, lendo, sem conseguir parar até agora, tudo o que vc tem escrito na última semana... sobre você, seus amigos, sua família, sobre o Edu... percebi que na verdade você também é um anjo. Um anjo que está ali ao nosso lado, quando precisamos de você. Que é forte quando a vida exige que você decida, que você suporte a dor. Que sabe quando falar e quando escutar. Que consegue como ninguém unir pessoas e transforma cada momento em único e inesquecível. E aí penso em como sou abençoada por ter compartilhado tantos momentos com o Eduardo e por ter vocês como amigos.