Mas não é. Li num blog português chamado "Partilha-te", que por sua vez faz parte de histórias de um livro com o mesmo nome. Me identifiquei e por isso estou anexando e compartilhando com vocês. Aos que vivem neste século aconselho a lerem porque é muito bonita, verdadeira e inspiradora.
A nossa história
Porque achei o projeto com interesse, quero partilhar a minha experiência homossexual com a esperança que ela irá contribuir positivamente para que a nossa sociedade passe a acreditar que uma relação “homo” pode ser tão bela e duradoura como uma “heterossexual”.
Uma vivência em união de fato “homo” só exige como qualquer outra uma coisa, a existência desse sentimento, tão velho como o mundo, a que se chamou “Amor”.
A minha relação começa em Outubro de 1967 no desaparecido Café Monumental com uma simples troca de olhares e de uma atração física muito forte. Depois de alguns encontros e apesar de ambos termos namorados, chegámos à conclusão que algo nos tinha acontecido e merecia um relacionamento mais estreito.
Ficámos livres e todos os dias surgiam mais indícios de entendimento, de interesses comuns e de um grande desejo de estarmos juntos, cada vez com mais frequência e durante mais tempo. Vão passando os dias até que em 1969 já não temos dúvidas, estamos unidos e presos por um grande amor. Há que investir nesta relação, fazer dela uma união familiar em que o meu e o teu passem a ser nosso e assumi-la se nos fosse perguntado. Com esta decisão deixei a casa dos meus familiares, alugamos uma casa maior e fui viver com ele e a mãe. Nesta altura começa outra fase da nossa vida a dois. Tudo é mais partilhado, desde um quarto só para nós à manutenção da casa, aos projetos para o futuro, aos problemas maiores e menores que surgiam por se viver em comunhão total, enfim tudo o que é inerente a uma família. Os anos vão decorrendo e, apesar de nenhum de nós sermos perfeito ultrapassamos as divergências surgidas com certa facilidade, talvez porque cada vez mais nos conhecíamos melhor e nos sentíamos unidos por um grande amor, compreensão e um entendimento sexual muito forte.
Nunca nos sentimos discriminados, nunca foi necessário afirmar que éramos um casal “gay”. Os amigos, colegas de trabalho, familiares e outros aceitaram-nos sempre sem perguntas ou insinuações. Talvez houvesse alguns que não estivessem muito de acordo, no entanto nunca o demonstraram, pois a educação é muito bonita mesmo que isso às vezes obrigue a engolir algum sapo. Fomos realizando os nossos sonhos, o apartamento com vista para o mar que tanto desejámos, viajámos, vimos os grandes espetáculos de ópera e musicais em Nova Iorque e Europa, tivemos uma vida a dois da qual não nos pudemos queixar e posso afirmar que vivemos a felicidade, não a total, porque não existe, mas a possível.
Mas como tudo tem um fim, em Janeiro de 2008, quarenta anos depois, ele partiu, foi traído pelo coração, esse mesmo coração onde tantos anos morei, disso tenho a certeza. Amei muito, mas também fui muito amado. Foi um grande desgosto, até porque nada fazia prever esta partida súbita. Valeram-me os amigos e famílias e até alguma ajuda médica. Fiquei na nossa casa, no nosso quarto que mantenho tal e qual estava, vivendo com a mãe dele que trato e tratarei o melhor que puder, não só porque a ela me ligam laços que considero familiares, mas também em memória dele que a adorava. Para terminar, afirmo que valeu a pena ter vivido esta união de fato durante 40 anos com um companheiro com quem partilhei uma paixão e um grande, muito grande amor. Hoje vivo com a saudade e as recordações de tantos anos. Sei que jamais voltarei a sentir algo de parecido. Viverei com a sua imagem, o seu querer, as suas palavras, poemas e tantas provas de amor que me deu, até ao dia em que partirei ao seu encontro. Serei novamente feliz!
PS. Recorri ao tribunal para me habilitar ao que a lei confere ao sobrevivente de uma União de fato. O julgamento já se realizou e espero a sentença.
Carlos
65 Anos
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