Certa vez a Dn Lúcia me perguntou como estavam às coisas no
apartamento e eu respondi que estava ali somente para molhar as plantas. Num
ato de revolta com a perda, ela disse que eu deveria deixar que as plantas
morressem já que quem deveria estar vivo era ele. Respeitei mas tive que
responder que tudo que ele cuidou e tocou tem sua presença e por isso já seria
motivo suficiente para não deixar que morressem. Sem contar que me faz bem
cuidar das coisas que ele gostava.
Pois é assim que eu penso. Não há um dia que não deixo de lembrá-lo
e quando eu vejo o jardim florido como está fico muito feliz. São flores e
plantas que ele comprou e plantou cuidadosamente. Cada uma está num lugar
definido por ele, suas mãos cavoucaram aquela terra para que recebessem as
espécies que mais lhe agradavam. Ficou naquele jardim um final de semana
inteiro, e terminou satisfeito com o resultado, portanto, é muito importante
que eu continue preservando, pois suas mãos estão impregnadas ali também.
Quando me vejo molhando o jardim parece que consigo ouvir
sua voz dizendo que eu devesse molhar mais a terra, deixar encharcado. Não dá
para não sorrir quando me vejo querendo acabar logo aquela tarefa e lembrar-se
dele cobrando a rapidez com a qual eu fazia. Reclamava sempre do meu trabalho.
E com razão, já que não tinha muita paciência. “São nossas filhinhas”, ele
dizia. “Nossas não! Sua! Não fui eu quem montou esse jardim. Por mim cimentava
tudo”, brincava com ele.
Aos poucos fui aprendendo a gostar daquela tarefa, tanto que
fiquei responsável por molhar as plantas, e até hoje continuo a fazê-lo. É o
momento que me desligo de tudo e fico pensando em tudo isso que estou contando.
Não é porque ele se foi que tudo deva acabar junto. Pelo contrário, penso que
boas ações, bons gestos devem ser lembrados e seguidos.
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